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Quem era Manoel de Barros

       Manoel de Barros foi um dos principais autores contemporâneos do país, marcou nossa literatura com versos ilustres de sua poesia. O poeta que trocou tribunais por folhas em branco, elefantes por formigas, e luxo por simplicidade, formou nossa cultura literária em poucos anos.

 

      Manoel Wenceslau Leite de Barros nasceu em Cuiabá (MT), no Beco da marinha, nosso sul-mato-grossense de fato, morador ilustre da Rua Piratininga, no Jardim dos Estados.

 

       O autor era muito tímido, quando ficou famoso, dizia que não valia para nada, seu único objetivo era ser merecedor do dom das palavras, como podemos perceber nos versos abaixo:

 

"A poesia está guardada nas palavras-é tudo o que eu sei.

Meu fado é o de não saber quase tudo.

Sobre o nada eu tenho profundidades.

Não tenho conexões com a realidade.

Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.

Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).

Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.

Fiquei emocionado.

Sou fraco para elogios"

 

     O poeta estará sempre conosco, presente em versos de nossa cultura. O grande marco de nossa literatura morreu em Campo Grande em 13 de novembro de 2014, deixando saudades para os que eram fascinados por suas obras.

 

    Manoel sempre deixou claro à sua família que quando sua morte chegasse queria se juntar a ela para escrever poesias aos anjos, a família, já preparada se manifestou. "Ele já não era mais capaz de ler e escrever e me disse que depois disso não valia mais a pena viver", conta Abílio, irmão do poeta.

 

   Outra sorte é que, antes de partir, nos mostrou o que está sob a pedra. Despertou emoções sobre o bruto. Levantou o que todo mundo chuta para chamar atenção ao sentimento, para sugerir paciência de lesma ao olhar apressado. Cultivou nas pessoas, com simplicidade profunda, como os amigos costumam definir.

"Vivi nos brejos, lugares úmidos que custam muito a secar. Eu convivi muito com essas palavras que aparecem em mim"

Manoel de Barros, o fazedor de versos:

    A poesia de Manoel de Barros desperta a atenção do leitor não pela temática que traz em sua linguagem, mas principalmente pela forma inusitada que escreve dando vida aos objetos.  O escritor achava que “Poesia é voar fora da asa.”

 

    Manoel traz em suas poesias o pantanal, marco de sua infância que também está presente em seus versos.

O fazedor de versos gostava da simplicidade presente na natureza, as formigas e objetos pequenos chamavam a atenção do autor. Sempre procurou em folhas, florestas, em formigas, elefantes, nos versos, a sua própria vida.

 

   O poeta sempre levou consigo, ao fazer versos, seu bloquinho e sua caneta que, por incrível que pareça, trouxeram poesias que nunca saíram das mentes que as leram.

 

    Manoel de Barros fez de nós cavaleiros da simplicidade, montados em cavalos da pureza de uma criança com armas de poesia, para marchar ao encontro da luxúria dos que não sabem amar.

 

  Esse era o Manoel que a todos encantou, esse era o Manoel que deixou simplicidade e amor nos corações de quem já soube amar.

 

“A maior riqueza do homem
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito. 

Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas, 
que puxa válvulas, que olha o relógio, 
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora, que aponta lápis, 
que vê a uva etc. etc. 

Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem usando borboletas.”- Manoel de Barros.

O Fazedor de versos em desenhos de sua filha.

O ilustre poeta tinha consigo uma carta secreta: sua filha, que, em seus desenhos, escondia os versos do pai.

     “Sua poesia sempre foi fonte de inspiração para muitos artistas. Acredito que por ser também uma poesia imagética. No meu caso, tem mais um componente. Somos parecidos de temperamento e bebemos da mesma fonte- a força da natureza do Pantanal. Sua poesia é libertadora e trabalhar ao seu lado sempre foi um prazer.” afirmou Martha de Barros, 63 anos.                                                                                           

      Martha Barros trazia em seus desenhos poesias ilustres de seu pai. A mesma dizia que compreender Manoel era compreender a liberdade. Ela teve a honra de ter consigo essa liberdade.

 

 

 

J. G. Pascale fala sobre Manoel de Barros

                                                        Perguntas respondidas por J. G. Pascale, jornalista e escritor.

1 - Você costuma ler poesia?

– Sim. Sempre gostei de ler poesia; além disso, de vez em quando, também escrevo poesias como exercício, pelo simples prazer de fazer. Não publico os meus poemas, só os guardo para mim.

3 - Manoel De Barros era “quem” para você?

 

– Prefiro dizer “quem é”, embora já tenha morrido (13/11/2014), pois ele é e será, cada vez mais, um dos maiores poetas brasileiros. A grande tarefa, agora, que resta a quem gosta de sua poesia, é fazer que ele seja redescoberto constantemente; para isso, é preciso manter seu nome em evidência. Manoel de Barros sempre será O menino que carregava água na peneira, que fazia Aprendimentos, desafiando Os deslimites da palavra e propondo Uma didática da invenção; além de tudo, foi O apanhador de desperdícios e O fazedor de amanhecer, isso porque nunca se cansou de fazer Exercícios de ser criança.

5 - Qual a influência das poesias de Manoel na sua vida?

 

– Para dizer a verdade, a boa poesia – como a dele, a de Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Vinicius de Moraes e Cecília Meireles – e a boa prosa – como a de Machado de Assis e Graciliano Ramos – são as mais saudáveis influências que pude cultivar em mim. Eles nos ensinam como escrever bem e, isso é muito importante, como escrever certo.

7 - Como a poesia pode mudar as pessoas?

 

– O papel da (boa) poesia não é diferente da (boa) literatura em geral, bem como da (boa) música), e das (boas) obras de arte em geral – a pintura, a escultura, o teatro, o cinema –; tudo o que puder despertar a essência humana nas pessoas poderá mudá-las para melhor. Sem poesia em sua vida, a pessoa embrutece; com poesia, ela se aproxima dos anjos.

2 - Você gostava das poesias de Manoel De Barros ou nunca leu uma?

 

– Conhecia o poeta Manoel de Barros há bastante tempo, mas apenas de “ouvir falar” e ter lido um poema ou outro em jornais – costumo dizer que poucas coisas na vida são maiores do que minha ignorância –; li sua poesia pela primeira vez, a sério mesmo, no Livro sobre nada, publicado em 1996. Essa obra é muito interessante. Gosto muito de alguns de seus versos soltos, como “O meu amanhecer vai ser de noite” – esse é puro non sense; agora vejam esses dois versos: “As palavras me escondem sem cuidado./ Aonde eu não estou as palavras me acham” – viram como ele brinca com as ideias e as palavras?; por fim, este: “Quero a palavra que sirva na boca dos passarinhos” – é um verso tão bonito que só uma criança o escreveria, a criança que existia dentro dele.

4 - O que mais te lembra ao ler os versos das poesias dele?

 

– Os versos de Manoel de Barros me fazem lembrar da criança que (ainda) vive em mim; seus versos têm cheiro de céu azul ensolarado, são coloridos como boa música e soam com toques de seda fina – por isso ele é inesquecível.

6 - Manoel achava a infância a melhor parte da vida, você também acha isso?

 

– Não, aí discordo dele, por estas razões: cada idade é muito boa no momento em que a vivemos; assim, é maravilhoso ser criança quando se é criança; é ótimo ser adolescente na adolescência; é bom ser adulto na idade adulta; por fim, na velhice é maravilhoso, ótimo e bom aceitar a idade mais avançada e ter na lembrança a certeza de que se fez o melhor que pode em cada idade da vida – por isso é tão bom viver.

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